03/03/2010

Simplesmente sem direcção

Não vos levo para nenhum destino.

Pobre recomeço mas e então? Será que todos os registos que fazemos têm de estar carregados de substância e sentidos multiplicadores de opiniões, abrindo a reflexões? Não, claro que não. Deixem-se disso.

Simplesmente ando a ler mais do que o habitual e descobri um livro com um prefácio delicioso. Há livros assim, com prefácios mesmo bons que subscrevem ideias verdadeiramente novas porque são em si mesmas a base de tantos lixos que já lemos. E de repente, com a ligeireza que só a vida e os livros conseguem, e ai se a vida consegue, descobri um cliché que não conhecia. Será possível que exista tal coisa? Desafio-vos, eu não conhecia. Pretendendo não vos levar a sítio nenhum, relato-vos a minha descoberta: “ o soberano é aquele que não toca nos puxadores da porta” – Henri Michaux.

E seguindo esta mesma rua de acasos que conduzem a descobertas, choquei de frente como uma série de televisão, que já abandonei há muito, para ouvir uma frase que soou com um gongo gigantesco dentro da minha cabeça. Estranhei porque de tudo o que me conheço, e oh se eu me conheço e conheço o que me desconheço, não conhecia que tinha tamanho gongo dentro de mim. E persistia, e bombava aquela frase “no meio dos olhos, no meio dos olhos” - voltarei a ela tenho a certeza, e da próxima pelos motivos verdadeiros desta cadência – entendi depressa que havia uma música que tinha de me lembrar mas qual? Também compreendi que estaria algures nos anos oitenta na categoria que um amigo meu representaria com uma simulação do corte dos próprios pulsos. A tristeza é que a minha afamada memória é uma raquítica parte de mim, a alegria é que essa memória colectiva que é o Google é uma imensa parte de nós. E ei-la. Não vos preparo o link porque estou demasiado preguiçosa para o fazer mas deixo-vos ainda assim a papa feita: http://www.youtube.com/watch?v=gJylDtXZprc. Vá eu espero mas não precisam de ficar a ver.

Espantoso não é? Não sei porque me lembrei dela, bem talvez saiba, mas nunca imaginei de quem era, e na realidade continuo a não saber. Quem eram estes? E que vídeo era este? Bem, da cena do tomate, a “explosion”, eu tinha memória. Como é possível que nos recordemos de coisas que não sabemos o que são? Este vídeo tem cenas para todas as taras e o pior é que eu lembro-me disto e isto veio-me à cabeça sem mais nem menos. Que memória a minha, faz-se. Faz-se de coisa presa a palavras e despreza nomes sendo que o nome é a primeira das palavras. Poço de contradições.

Não vos levo para nenhum destino.

Não vos levo para destino nenhum.

Pretendendo não vos levar a sítio nenhum, por isso, não contestem por terem vindo.


Nada como um pouco de cera para puxar o lustre.

01/09/2009

À Sombra da bananeira



O conceito em si é predominantemente perjurativo. Quem está à sombra da bananeira está, tácita ou declaradamente, sem fazer nada, mandriando descaradamente, quase sempre, nas barbas de outros.

Parece-me que este estado de espírito só pode ter tido origem em latitudes temperadas, ou melhor, em latitudes de temperaturas quentes, primeiro porque as bananeiras não crescem na escandinávia e em segundo lugar porque a sombra é fresca onde faz calor e fria onde faz frio. Esta constatação associada à observação preguiçosa que o outro, ou outros, que não está na dita sombra possuí as ditas barbas, remete-me para um imaginário revelador em que ambos estarão em terreno arenoso e aprazível, um descansando e outro, de barbas, produzindo.

Por esta altura, quem lê estas linhas já concluiu, de certo, que se tratam de dois, ou mais, piratas que se encontram numa qualquer ilha tropical onde o primeiro pelo seu estatuto ou por crua presunção descansa enquanto os demais executam o seu trabalho que, agora evidente pelo contexto sugerido, se traduz em subterrar levianamente um imenso tesouro confiscado em nome próprio em alto mar.

Enquanto escrevo noto que esta página bem poderia tratar dos piratas ressurgidos no nosso século, refiro-me àqueles que atacam os barcos nas costas da Somália mas bem poderia referir-me aos outros, os que atacam contas bancárias e poupanças, ou aos que atacam empregos. Mas o que me trouxe aqui foi a sombra e as bananeiras, deixo os piratas para outra ocasião.

O que me trouxe foi o imperativo de pôr por escrito que às vezes os que estão à sombra da bananeira são aqueles que com um árduo empenho a semearam e plantaram e até o conseguiram fazer longe do habitat natural da planta. Não obstante, que fique em mente, a bananeira não sendo uma árvore de patacas é um ser vivo que exige cuidados e atenção ou definha e rapidamente morre.

04/06/2009

1+1 hão-de dar 3

Existem palavras que quando combinadas de determinada forma accionam correntes de raciocínio na minha cabeça. Estes vocábulos, que naturalmente variam dependendo do momento, têm uma força física ou química, estranha e potente, e são capazes de fazer correr macros ocultas - se preferirem a analogia. Têm também um componente aleatório ou circunstancial porque variam na forma como me conduzem e, consequentemente, não chego sempre ao mesmo destino, ou nem chego a destino nenhum, como sucede na maioria das vezes, paro numa qualquer estação de comboios onde o aviso electrónico deixa ler “aguardar pelo próximo estímulo cerebral”.

O melhor é sentares-te, penso, e assim, eu, ou melhor, a ideia lá fica a fermentar ao sol, porque não veio prevenida e não trouxe chapéu de palha. Mas depois, outra corrente eléctrica cerebral traz um outro pensamento, que por ter percorrido um caminho diferente tem uma perspectiva nova, e que chega a grande velocidade, como acontece com tudo o que é transportado por correntes eléctricas, cerebrais ou não, chocando inadvertidamente com o pensamento que lá repousava, fundindo-se com este e revelando todo um mundo novo.

Todos o fazemos de certo, mas a realidade é que, e sem ter lido ou pesquisado em jornais científicos, intelectuais ou feministas, podendo assim acenar com o conforto que só nos dá a ignorância, acredito que uns fazem-no até a dormir e outros necessitam de o fazer em voz alta, muito alta. Todos temos essas células nervosas activas chamadas neurónios, por onde circulam os fluxos de correntes eléctricas conscientes, a que por vezes chamamos de pensamentos, e os inconscientes, a que apelidamos sem limites.

Não sei a qual dos grupos pertencem os resultados das macros a que me refiro mas, por vezes, tenho consciência de considerar o que os outros ainda não discorreram, o chamado “muito à frente”, sobretudo com situações relativas às relações humanas. Um flagelo. Inevitavelmente conduz-me a essa estação de comboios onde ainda não chegou ninguém, onde vejo cenários e contingências, que por o serem, não se realizam, ainda bem, ainda mal, o que podia ter sido é realmente um tormento. Reboot. E depois, se partilho, fico à mercê da piada fácil, neurónios, neurótica, delírios, xanax, não gosto de estar à mercê de piadas fáceis, dêem-me as difíceis. Ou simplesmente fico à mercê de mim própria, senão vejam, vinha falar de silêncios e o que fiz foi escrever sobre o ensurdecedor ruído dos meus pensamentos que ainda não vejo concretizados.

28/05/2009

Semi-deuses

Deixaste-me em estado de euforia, semi-deus num mundo de mortais, sinto-me impregnada de desejo; desejo por ti.

Ando estouvada, salto enquanto caminho e danço enquanto corro, transbordo inquietação. Ainda assim, sinto-me capaz de pairar tranquila sobre as ondas, e de escutar os seus murmúrios, vejo o azul pálido transformado em azul índigo, brilhante e forte, magnífico.

Cegas-me e deixas-me extasiada e presa à tua presença. Quando não estou contigo fantasio o nosso próximo momento juntos e precipito a passagem das horas.

Quando te reencontro sorvo o instante com ganas de te reter aqui e tu atiças-me com provocações e assustas-me com a particularidade o teu discurso...A diferença entre o que sentimos está somente no momento em que o fizemos palavras.

Este sentimento, forte demais para ser contido, cresce em risco e aproxima-se de uma paixão desafiadora de normas e convenções.

Acautelem-se os mortais, pois estes são semi-deuses encantados.

12/05/2009

Longo tempo no teu espaço

Não tenho a pretensão de saber qual é o segredo do sucesso para uma relação duradoura, ainda assim, ouso, porque conquistei uma vivência a dois que já dura a alguns aninhos, arranhar algumas considerações.

Pouco importa o título que essa vivência possa ter, ou talvez importe mas não deverá pesar mais do que qualquer outra projecção que façam sobre nós. As uniões de facto, por exemplo, são casamentos anunciados sem data marcada para o dia da festa; seja por opção, necessidade ou convicção é também um compromisso que se assume todos os dias e não difere dos outros assinados em contrato.

Muito importante é que sejam assumidos os vícios de forma. As dificuldades emergentes de incompatibilidades recorrentes não fazem sentido e, a meu ver, o indivíduo tem duas opções: avocar que as discrepâncias de opinião ou de valores não são factores decisivos, e deixar-se embalar pela situação; ou reconhecer que os antagonismos constantes representam uma carga colossal que não pode ser transportada a uma longa distância.

Eu pessoalmente tenho um vício de forma muito particular, não acredito na constância de uma relação, acredito que as relações estão condenadas ao fracasso - quem diria !?...dirão alguns! Talvez por isso proclame que o empenho que pomos nelas deve ser desmedido, ou melhor, desprovido de medida mas em doses industriais. Não é tão só que parar seja morrer... deixarmos que cresçam buracos negros por falta de atenção é, antes de mais, um desperdício de vida.

Mas os buracos negros são problemas que podem surgir mas mais adiante… no início são apenas pequenos espinhos, que sejam pois identificados para que não nos piquemos todos os dias.

Quando seis meses são tão bem vividos e em tanta harmonia deviam contar como seis anos.

07/05/2009

Perdi um elefante

Perdi um elefante,
parece descabido
mas é verdade
está perdido!

Procurei-o nas gavetas
nas mesas e nas estantes
porque são estes os sítios
onde se perdem elefantes.

Não consigo entender
como se perde um elefante
afinal o paquiderme
é ou não um gigante?

Não encontro o motivo
para que ande desvairado
para mim é importante,
e se fica constipado?

Enerva-me esta busca,
anda fugido na certa
deve ter-se escapulido
por alguma porta aberta.

Logo que lhe sinto a falta
dou por ele sumido
arrebito as orelhas
mas não ouço nem zumbido.

Fugiu pé ante pé
sem deixar rasto nem nada,
perdi um elefante
antes perdesse uma manada,

Tal o número de bichos,
seria fácil de encontrar
mas um só elefante
onde o vou desencantar?

Encontrei-o por fim,
na areia espraiado
com um ar de felicidade
por um dia bem gozado.

Gozou-me ele a mim
que o busquei preocupado
o danado do bicho
Parecia dizer-me: Apanhado!




não foi este o elefante que perdi, este é o elefante de http://www.andreaslinzner.de/

28/04/2009

Extra! Extra!

A 79ª Feira do Livro de Lisboa abre esta semana.